sábado, julho 29, 2006

Para acabar de vez com os subsidios

É realmente chocante a tendência de redução dos subsidios do Estado à cultura, cujo principal rosto, neste momento, é Rui Rio.
Trata-se de uma tendência que revela uma rendição ao mais básico economicismo e à lógica de mercado, que impede uma oferta cultural diversificada, livre e democrática.
De facto, o que seria de Picasso, Pollock, Callas, Brecht, Wells, Fellini, Hemingway, Hesse, e todos os outros grandes artistas deste século sem subsidios estatais?
E depois ainda há quem fale em "dependência" ou que diga que a "cultura é um bem como outro qualquer".
Francamente.
NG

quinta-feira, julho 27, 2006

Lembras-te?

Num 4 de Julho, ofereci-nos um caderno de capa areada e folhas de papel vegetal. Imaginei-nos num tempo mais longe, e vi as nossas mãos enrugadas juntando pedaços de papel amarelado, borrados de tinta preta, tentando decifrar o que a nossa juventude disse. E vi-nos de cabeças juntas, rindo e chorando do que as nossas almas pela vida fora cantaram para aquele caderno de capa areada e folhas de papel vegetal.
Nunca mais lá escrevemos. Creio que não por falta de tempo ou de vontade. Aquele 4 de Julho foi o tiro de partida para uma corrida louca, que nos fez saltar, cair, festejar,sofrer,rir e chorar.E tanta coisa nos aconteceu, tão intensa, que as palavras não chegam ou simplesmente não nos chegaram.
O caderno de capa areada e folhas de papel vegetal está lá, esperando, paciente, mantendo guardados meia dúzia de escritos que lá deixámos, dos quais não recordo o assunto. Minto, lembro-me do primeiro. É um poema, que te deixo aqui, porque me lembrei dele e apeteceu-me lembrar-te dele:

You worry that i will leave you.
I will not leave you.
Only strangers travel.
Owning everything,
i have nowhere to go.


Leonard Cohen

Lembras-te?

NG

sexta-feira, julho 21, 2006

Rei

Somos complicados, nós, os humanos. Mais complicados ainda somos nós, os adultos. Buscamos prazer em tudo, com tudo, e tudo buscamos, sejam coisas com fios e cores ou capas bonitas com sons novos ou carcaças aerodinâmicas com rodas largas ou pedaços de areia com árvores espetadas ou cargos com nome sonante ou projectos inovadores e motivantes ou pedaços de pano impregnados de euros ou circulos à volta de ponteiros platinados ou refeições com o preço maior do que as doses ou fins-de-semana de charme ou multiplas outras coisas que diariamente nos entram pelos sonhos a dentro. Sonhos que resumimos a sacos de compras. Queremos ser Reis no Reino da Futilidade.
Sentado no segundo degrau da minha escada, deixando arder um cigarro, ouvi uns passos de pés pequenos atrás de mim e senti dois bracinhos a envolver-me a cabeça e a apertá-la. Como uma coroa.
Senti-me um Rei.
E como Rei, caguei, e caguei de alto, para as coisas com fios e cores e para as capas bonitas com sons novos e para essa inutilidade toda.
O meu Reino, o Reino do qual sou Rei, é este. Nele tenho a minha Rainha e a minha Princesa. E neste Reino, mesmo sem fadas, viverei feliz para sempre.
NG

terça-feira, julho 18, 2006

Ela disse

Ela disse: Eu não o escolhi, foi a vida que o escolheu para mim. Eu não recebi candidaturas, não conduzi um processo de selecção. A vida pô-lo à minha frente, ele sorria para mim, eu ria-me do que ele dizia e foi isto. Haveria uma centena, talvez um milhar de homens que poderiam ter sorrido para mim, ter-me feito rir. Mas a vida apenas me pôs aquele à frente. E foi isto.
Ela, com um sorriso usualmente classificado como estupido, encolheu as lágrimas com um suspiro e continuou: Ele começou a gritar comigo. Eu chorava. Eu não sabia que poderia não ser assim. Simplesmente não sabia. Quando ele gritava, só chorava. E um dia não conseguia parar de chorar e ele acompanhou os gritos com estaladas. Até eu parecer que parava de chorar. Na verdade, aprendi a chorar para dentro.
Ela, fechando os olhos, mostrou uma cara serena e continuou: Ele nasceu, o meu primeiro filho. Foi bom. Muito bom. Até ele se aperceber dos gritos, dos choros, das estaladas. Quando ele chorava, o meu filho, eu sentia lágrimas de sangue. A dor era maior do que tudo. Do que tudo. E parei de chorar, ensurdeci-me, endureci o meu corpo. Ao meu filho dei todo o meu coração, todo o meu sangue, tudo o que consegui dar.
Ela libertou o choro mas manteve a voz: O meu filho cresceu, está lindo, trata bem a mulher. Trata-a mesmo muito bem. E ela é bonita, vou ter netos fantásticos. Fantásticos. Sonho com isso.
Ela esfregou as costas da mão nos olhos e continuou: Ainda estou com ele. Ele já não me grita. Ou eu já não o ouço, não sei bem. Ele já não me incomoda e o meu filho é lindo, a mulher dele é bem bonita e vou ter netos fantásticos. Sonho com isso. Sabe-me bem sonhar.
Ela terminou: A vida pô-lo à minha frente, foi a vida que o escolheu para mim. Aprendi a viver com ele. Ainda estou a aprender a viver comigo.
NG

quarta-feira, julho 12, 2006

Para aqueles que acham que o Petit é mauzinho

Vejam isto (descoberto através do Adufe, cujo autor é lagarto mas, apesar disso e aparentemente, bom rapaz).

NG

terça-feira, julho 11, 2006

Realidade

Após a completa alienação provocada pelo Mundial, é tempo de voltarmos à realidade e concentrarmo-nos nas coisas efectivamente importantes. Por exemplo, o Benfica está a pouco menos de um mês de disputar a 3ª pré-eliminatória da Champions League e o Miccoli ainda não chegou. Vai chegar? E o Simao, vai ser vendido? E o Luisão, também?

Ah, doce e bela realidade!

NG

sábado, julho 08, 2006

Adeus geração de ouro. E obrigado.

Baia, Couto, FDP e João Pinto da geração de Riade, e Jorge Costa, Rui Costa e Figo da geração de Lisboa. Juntos, formaram a geração de ouro. Nos seus clubes, somaram toneladas de titulos e prémios individuais que no espaço de um post não cabem. Na selecção, passámos a marcar quase sempre presença, estivemos em 3 europeus, 2 mundiais, com 1 presença nuns quartos de final, 2 em meias-finais e 1 numa final. Faltou o título, paciência. Pena que o único treinador português digno desta geração ainda não tenha idade, nem motivação, para a selecção. Chegariamos lá.

Obrigado a todos. Mesmo ao FDP.

NG

Porque não fizeste isto em Maio, pá?

Pauleta anuncia adeus à selecção nacional.

NG

quarta-feira, julho 05, 2006

Portugal no Mundial - Notas

Scolari: 18 por nos ter levado às meias-finais; -3 por ter falhado a final; nota final: 15.
Ricardo: 19. Não só pelos penalties, mas por ter sido sempre seguro, inclusive nos cruzamentos. Esperemos que no Sporting volte ao normal.
Miguel: 17. Um dos melhores laterais do torneio, impecável a defender, lesto a atacar. Pena é que ainda não tenha aprendido a cruzar.
Meira: 17. Começo algo titubeante durante a fase inicial. Depois disso, quase perfeito.
Ricardo Carvalho: 19. Com Fabio Cannavaro, o melhor central do mundo. Ponto final, parágrafo.
Nuno Valente: 14. Já não tem pernas para atacar nem para defender adversários muito rápidos. Mas a sua experiência dá para disfarçar essas limitações.
Costinha: 8. Nota negativa, não apenas pelo erro infantil frente à Holanda, mas por não ter correspondido em nenhum jogo. Sem fôlego para a sua posição natural, por falta de ritmo de jogo ou de juventude, mostrou-se desenquadrado.
Petit: 12. Mostrou todas as suas qualidades - voluntarismo, esforço, garra - e os seus defeitos - falta de sentido posicional, pouca técnica. Mas sempre útil.
Maniche: 19. O jogador mais regular em todo o torneio, recuperando bolas, distribuindo jogo, rematando, marcando golos. Uma aposta claramente ganha por Scolari, naquele que merece consagração como um dos melhores médios do torneio.
Deco: 11. Apenas leva nota positiva por ter marcado um grande golo. De resto, tal como o seu companheiro do Barcelona, falhou. E falhou principalmente no jogo em que ele deveria desiquilibrar: o desta noite. Não procurou a bola, não forçou o drible, passou ao lado do torneio.
Figo: 15. Um exemplo de dedicação e esforço. Já não tem pernas para extremo, apesar de se ter apresentado em muito melhor forma fisica do que no Euro 2004. Pena aquele falhanço contra a França que provavelmente nos levaria à final. Ele, mais do que qualquer outro, merecia-a.
Ronaldo: 16. Pressionado por todos os lados - público, imprensa (desportiva e cor-de-rosa), árbitros - deu a volta por cima, e mostrou uma maturidade, ou melhor, classe, invulgar num jogador da sua idade. No seu melhor jogo, com a França, Scolari cometeu o crime de o esconder como ponta-de-lança. Foi pena. Mas mostrou todas as suas invulgares qualidades. Amigos ingleses: se Rooney é Pélé, Ronaldo será o quê, Deus?
Pauleta: 3. O 3 deve-se ao golo com Angola. Pauleta é um jogador que pura e simplesmente não tem qualidade para jogar contra equipas deste nível. Esconde-se, não procura a bola, não salta com os defesas, nada. Não é um dado novo, basta recordar o seu idêntico desempenho durante o Euro 2004. Continuará a ser útil naqueles jogos que antigamente Portugal muito difilcilmente ganhava (Malta e equipas similares). Mas competições destas são areia demasiada para a camioneta do Pauleta.
Simão: 14. Entrou sempre muito bem e marcou penalties com a serenidade de um grande jogador. Já deve estar vendido por umas boas massas. Só por isso, leva mais um valor e passa a 15.
Hugo Viana: 12. Poucos minutos mas de muita qualidade. Certeza de passe, remate fácil, por mim pode vir para o Glorioso.
Tiago: 9. Depois da época em Lyon, esperava o dobro dele. Ficou-se pelos serviços mínimos, talvez por falta de condição fisica ou de confiança. Sem Deco, precisávamos de um Tiago ao seu nível. Não o tivemos.
Hélder Postiga: 3. O 3 deve-se ao penaltie contra a Inglaterra, marcado com classe (ou irresponsabilidade, mas o efeito é o mesmo). É um claro erro de casting, não só para esta competição, mas para o futebol. Como ponta-de-lança, e mais do que inútil: atrapalha, destroi o jogo da nossa equipa e a nossa paciência.
Paulo Ferreira e Boa Morte: não deu para aquecer.
Nuno Gomes: 16 (potencial). Aqueles minutinhos com o México foram suficientes para mostrar o que poderia ser a equipa portuguesa com um avançado que sabe receber uma bola, guardá-la, distribui-la, enquanto faz os centrais mexer-se. Com ele, Portugal poderia ter jogado em 4-3-3. Sem ele, jogámos sempre em 4-5-1. Ser 3ª hipótese, ainda atrás de Postiga, é humilhante. Mais vale fazerem como fizeram ao Baia e nem sequer o convocar.

NG

O que devemos a Scolari

1. Chegar às meias-finais

Scolari conseguiu criar uma equipa unida, sem vedetas, segura e combativa, capaz de se superar fisicamente.

2. Não chegar à final

Perante uma equipa que é uma versão reumática das equipas de 84 e principalmente de 2000 (leia-se: acessível), Scolari mostrou-se, mais uma vez, incapaz de mudar a equipa tacticamente. Para além disso, afogou aquele que estava a ser o único elemento desiquilibrador (Ronaldo) no meio das torres francesas, deixou em campo Figo, que esteve à beira de um colapso fisico, e insistiu numa nulidade chamada Postiga (e não, não vou voltar a falar de Pauleta).

Balanço: É óbvio que ver Portugal perder pela terceira vez uma meia-final (na primeira, em 66, não era nascido) e ainda por cima com a França, dá-me vontade de agarrar num lança-chamas e queimar tudo o que soe à terra do pãozinho com sovacâme (Gerentes do Carrefour, ponham-se a pau!). Mas servindo-me do bocadinho muito pequenino de racionalidade que tenho neste momento, o balanço é muito positivo.

Agora, caro povão português super-endividado, o cobrador do fraque, como disse Toni, está de volta. É tempo de voltar a assentar os pés em terra.

NG

p.s. Gabi, se ainda "aí" estiveres, parte umas montras por mim.

Portugal-França - 1ª parte

O árbitro está-nos a gamar à grande .... e à francesa;
O Deco tem que entrar no jogo;
O Pauleta tem que sair do jogo;
Vamos ganhar 3-1.

NG

domingo, julho 02, 2006

Como vamos ganhar à França

Ricardo; Miguel, Meira, Carvalho, Valente;Costinha, Maniche, Deco; Ronaldo, Figo e Pauleta.
Ronaldo encostado à direita, que o defesa esquerdo francês é fraquinho. Costinha vigiando Zidane, sem faltas (sorte para nós o facto de terem, nesta altura, o mesmo ritmo de caracol). Defesa recuada, que Henry pode escapar e Portugal não está rotinado para o fora-de-jogo. Pauleta lesiona-se, sem gravidade, mas não poderá estar na final. Deco resolve este jogo.
E venha a Alemanha (wishfull thinking, absolutamente wishfull thinking. Só com uma arbitragem empenhada os italianos não serão os nossos parceiros na final).
NG

God damn Eriksson

Antes de Eriksson, os jogos da selecção inglesa eram garante de espectáculo. Não só pelo que jogavam mas também pelo que deixavam jogar. Era um estilo que deu poucos frutos, para além do título de 66 e de uma meia-final em 90. Os ingleses eram uns românticos, que jogavam sempre para ganhar e perdiam.
Eriksson impôs um tipo de jogo e um ritmo contra-natura para os jogadores ingleses. Pô-los a jogar curto, na expectativa, como os continentais. Em alguns jogos, chegou a alinhar apenas com um homem na frente. Tudo coisas de arrepiar qualquer adepto do kick-and-rush (como eu). Tudo isto poderia ser atenuado se ele tivesse ganho alguma coisa. Mas não. Fez pior. Perdeu e tirou-nos a hipótese de ver jogos fantásticos, com correrias loucas, remates de quilómetros e profusão de golos.
God damn Eriksson!

NG

O Sr. Scolari e a Inglaterra

Fez bem o Scolari em armar o trio do meio-campo com Tiago. Só assim Portugal conseguiria equilibrar o jogo, perante o betão de Gerard-Lampard-Hargreaves. Bem também no assumir de um jogo controlado, de passe curto e do posicionamento quase constante de Ronaldo na esquerda (na direita mora o melhor lateral esquerdo defensivo do mundo), esperando que este resolvesse o jogo. Tudo bem, portanto, até à expulsão de Rooney. Depois desta, Scolari esperou que os ingleses se descontrolassem e tentassem o ataque, e trocou Pauleta por Simão, montando um triangulo de contra-ataque. Só acreditaria nisso quem não conheça o "italiano" Eriksson. Perdemos uma hipótese de vitória. E perdemos outra, quando meteu mais um poste, que dá pelo nome de Postiga. Dois erros que levaram o jogo para prolongamento e penalties. Salvou-nos, mais uma vez, Ricardo. E a falta de classe das "vedetas" inglesas.

NG

Dos fracos não reza a história

A guerra é a maior paixão dos homens. Nada despertou tanta emoção, tantas linhas, tantas imagens. Nos dias de hoje, a guerra deixou de ser clara, tornando-se dificil identificar os lados bom e mau. Para além disso, tornou-se um exercicio tecnológico, uma espécie de guerra à distância, deixando a bravura, ou a cobardia, como características inaplicáveis ao século XXI.

O futebol é uma guerra. À antiga. São exércitos de 11 contra 11, armados apenas com sapatos com pitons, dirigidos por Generais aos gritos, debaixo dos olhos de multidões ululantes. É por isso que o futebol arrasta milhares de milhões. Ninguém perderia anos de vida e muito dinheiro apenas para ver uns belos dribles, uns passes mágicos ou uns golos fantásticos. São batalhas o que queremos ver. São batalhas os jogos de futebol.
Como na guerra, o futebol tem os seus heróis e os seus fracos. Heróis não são apenas os que ganham, são, essencialmente, os que fazem tudo para ganhar. Eusébio é um herói. Foi ele que, quase sozinho, venceu a batalha contra a Coreia do Norte. Foi ele que tentou tudo contra a Inglaterra, debaixo do assalto de Stiles, e se despediu com lágrimas. Maradona foi tanto herói em 86 ganhando, como em 90 perdendo. Em 90 arrastou uma equipa mediocre pelos campos de batalha italianos, defrontando exércitos mais poderosos. Era inumano conseguir ganhar aos alemães. Mas ele tentou, até ao limite das suas forças. E despediu-se dessa batalha como um herói: chorando de raiva.
O Brasil que ontem perdeu com a França não teve heróis. Ronaldinho, o técnicamente melhor jogador do mundo, quando mais o seu exército precisava dele, escondeu-se, fugiu. Na lógica simplista, mas apaixonante, do futebol, Ronaldinho foi um fraco. E dos fracos não reza a história.

NG